quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

Coimbra,percursos por espaços e jardins com história


Monte dos Olivais, Penedo da Saudade, Parque de Santa Cruz e o Jardim Botânico.

Penedo da Saudade

Iniciei este curto, mas rico percurso, com uma extensão aproximada de sete quilómetros, junto ao antigo ermitério dos Olivais, hoje Igreja da Paróquia de Santo António dos Olivais. Segui pela antiga cumeada que deu lugar à bem traçada Avenida Dr. Dias da Silva, ladeada por moradias de belo efeito,  até ao Penedo da Saudade, outrora um lugar quase ermo, hoje um lugar rodeado por vivendas e algumas edificações de maior volumetria. Do promontório rochoso que lhe deu nome, sobre paisagem de olivedos e laranjais podemos hoje observar uma floresta de edificações diversas, por onde foi crescendo a cidade.

O Penedo da Saudade, tal como referido em livros antigos já não existe. No entanto não perdeu a sua áurea e beleza, sendo bastante agradável deambular pelas suas veredas, parar no Retiro dos Poetas e ler algumas lápides com versos.



Penedo da Saudade - Retiro dos Poetas
À entrada do jardim, pelo lado mais baixo, ergue-se um busto ao poeta António Nobre e outro ao escritor Eça de Queirós. Descendo do promontório, pelo interior da mata é hoje possível aceder à parte baixa da cidade.


Conta-nos a lenda que D. Pedro I para aqui vinha frequentemente desafogar a sua mágoa e chorar a sua amada Inês, sendo na altura o local conhecido por Pedra dos Ventos, apenas no século XVI viria a ser designado por Penedo da Saudade.


Penedo da Saudade - Panorâmica sobre a cidade





Deixando para trás o Penedo, já com Saudade, segui na direcção do Parque de Santa Cruz, vulgarmente conhecido por Jardim da Sereia. A entrada principal é enobrecida por um aparatoso pórtico, ladeado por dois torreões, rematados por telhados pontiagudos de duplas águas, decorados a fresco no exterior e interior.




Parque de Santa Cruz - pórtico ladeado por torreões

O pórtico tem uma arcada tríplice, ornamentada com concreções calcárias, também utilizadas noutros arranjos do parque, encimada por três esculturas, de belo efeito, representando a Caridade, a Fé e a Esperança.


Transposto o pórtico, segue-se o grande recinto do Jogo da Pela, ladeado por carvalhos e loureiros e marginado por muretes, rematados em cantaria, cujas extremidades são marcadas por pilares com urnas, que se repetem neste local de recreio, numa cenografia marcadamente barroca.



Parque de Santa Cruz - Cenário em forma de cascata
No topo um majestoso cenário em forma de cascata, que se eleva em gigantesco trono de retábulo, em degraus de concreções, encimado por uma bela escultura de Nossa Senhora da Conceição e, em plano mais recuado, dois belos medalhões de azulejo figurativo, ladeados por esculturas dos evangelistas.

Integrado no conjunto, um aparatoso escadório, entremeado de patamares e ladeado por bancos de pedra, decorados por azulejos com motivos alusivos à água, leva-nos à Fonte da Nogueira.




Parque de Santa Cruz - Fonte da Nogueira
A fonte tem um nicho na parte superior, albergando uma imagem da Virgem, em baixo um tritão abre a boca a um golfinho, donde corre a água para uma concha. Pela designação do povo é a Sereia, que emprestou o nome pelo qual o parque é mais conhecido.

Um ponto bem atractivo no parque é o seu belo lago, com uma ilhota central onde mora uma fonte, onde no tempo dos crúzios esteve plantada uma laranjeira.

Parque de Santa Cruz - Escadório entremeado de patamares
Infelizmente este belo e aprazível local tem sido alvo de miseráveis actos de vandalismo que têm destruído total ou parcialmente esculturas, azulejos, pilaretes e outros elementos decorativos.

Deixando um dos locais mais frescos e aprazíveis da cidade, não foi preciso andar muito para alcançar o majestoso Jardim Botânico, talvez o mais aprazível e deleitoso local da urbe mondeguina, quer pelos seus inúmeros recantos quer pela paisagem que daqui se desfruta.



Jardim Botânico

Inserido numa área de aproximadamente 13,5 hectares, o Jardim Botânico foi delineado no prosseguimento da reforma pombalina dos estudos universitários. Em 1773 esteve em Coimbra o arquitecto inglês Guilherme  Elsden e, em conjunto com os professores Vandelli e Dalla-Bella, escolheram o terreno, o qual pertencia, quase todo, ao colégio de São Bento, que o ofereceu gratuitamente.





Ilustração 13: Jardim Botânico – panorâmica do patamar inferior
Os professores italianos e Elsden executaram um projecto que o Marquês de Pombal rejeitou, por demasiado grandioso e dispendioso, no mesmo ano de 1773. Contudo as obras começaram, embora de forma mais modesta, prolongando-se por todo o século XIX e mesmo pelo Século XX.
Ilustração 14: Jardim Botânico - vista para a mata e antigo Colégio de São Bento
O jardim divide-se em duas partes: a que ocupa o alto e princípio do vale, que é distribuída em terraços e ajardinada, e a mata que se lhe segue, até perto da Rua do  Brasil, onde há uma capelita, que pertencia ao antigo colégio de São Bento.
Ilustração 15: Jardim Botânico - patamar superior e estufas
A primeira distribui-se por cinco terraços, em anfiteatro de lanços rectilíneos, envolvendo o sexto, o mais inferior e quadrado.
Ilustração 16: Jardim Botânico – recanto do patamar inferior
Em volta deste último, formando balaustrada do imediato, dispõe-se o conjunto arquitectónico que, não obstante a sobriedade dos seus motivos, lhe dá um lugar de destaque na arquitectura citadina como exemplar do neoclássico.
Ilustração 17: Jardim Botânico - Patamar inferior
O terraço mais inferior é dividido da mata por um muro rasgado duma porta central e de janelas, encimada, aquela e duas destas, de altos remates mas austeros.
 O parapeito, que no terraço imediato o cerca, divide-se alternadamente em partes vazadas e em plenos ocupados por alegretes, com bancos intermédios.
Ilustração 18: Jardim Botânico - Lago no patamar inferior
Ao centro de cada uma das três faces ficam portões que dão serventia ao terraço central por escadarias duplas. Os dois laterais são mais simples: dois pilares isolados coroados cada um de seu vaso, acompanhados de breves aletas laterais apoiando-se num muro baixo, à altura do soco daqueles, muro que completa o conjunto e em cujo extremo se apoia novo vaso ornamental. Tem batentes de ferro, simples e da mesma época. No terraço superior e em frente destes, abrem-se dois novos portões, do mesmo género e mais simples e sem grades, a que dá acesso uma escada de degraus curvos, construídos alguns anos depois dos anteriores.
Ilustração 19: Jardim Botânico - patamar inferior
A vedação superior do jardim é notável, na parte principal, a da Avenida Júlio Henriques, pelo efeito de monumentalidade que se obteve com elementos simples: pilares com as faces externas em pilastra dórica de cantaria refundida, coroados por uma urna esbelta; pilares que nos extremos se tornam mais robustos e suportam altas pirâmides, e que se repetem duas vezes no lanço maior do gradeamento, subdividindo-o e quebrando a monotonia..
Ilustração 20: Jardim Botânico - Portão principal
O portão principal, constituído por pilares compostos sem arco intermédio, não fica ao centro mas bastante para o lado do aqueduto. Tem cada pilar duas fortes colunas dóricas, postas ligeiramente em diagonal, com frontão interrompido e remate de alta pirâmide, acompanhada de urnas.
 São de ferro os batentes e de desenho simples. Na bandeira, mais ornamentada, encontra-se a data de 1844. Assinou-os o serralheiro M. Bernardes Galinha: "M Bdes GALHINHA / O FEZ EM / Coimbra", daqui a adivinha: preto é, Galinha o fez.
Em frente, no larguinho da entrada, a estátua do professor Félix de Avelar Brotero, um dos primeiros orientadores do jardim, obra de Soares dos Reis, em 1887.
Ilustração 21: Jardim Botânico - foto de arquivo
O Jardim Botânico, para além da sua beleza, tem o lado científico, como centro de estudos por excelência, pelas espécies que conserva, permitidas pelos microclimas deste local, nomeadamente de espécies originárias do Himalaia e da América do Sul, constituindo um verdadeiro Museu Vivo. O conjunto de estufas tem passado por um processo de recuperação e manutenção, para poder continuar à disposição da comunidade científica e a quem mais possa interessar.
Ilustração 22: Mata e acesso entre Rua da Alegria e Porta da Traição
Numa feliz iniciativa de dinamização do espaço, a Universidade de Coimbra e a Câmara Municipal de Coimbra protocolaram um percurso pelo interior da mata, que é possível fazer em miniautocarro panorâmico de tracção híbrida, ligando a rua da Alegria ao Arco da Traição, na antiga muralhada. Contudo desde o seu anúncio que essa possibilidade tarda em aparecer, esperemos um melhor desenvolvimento de todo o processo, por forma a permitir a circulação das viaturas.
O percurso 2 compreende pouco mais de quatro quilómetros de ligação entre os parques, contudo para quem se pretenda exercitar, o Parque de Santa Cruz permite estender essa distância em função da vontade de cada um. A beleza e singularidade dos espaços visitados obrigou a que desfrutasse da sua grandeza.
Contaremos na próxima edição encerrar o percurso 3, da Traição às Lágrimas de Inês e da Lapa ao Choupal  





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